É assim, nêgo.


Eu disse que não era hora de ter poltrona em casa, mas você, nêgo, não me ouvia quando colocava uma ideia na cabeça. Era aquilo e pronto!
Agora ela continua aqui, no mesmo ponto, voltada para a janela de onde se pode ver ao mesmo tempo as luzes da cidade quando se acendem, os carros passando velozes e nos dias certos, a lua. E nestas noites de lua, nêgo, o coração aperta mais.
O acento da poltrona já moldado por nossos corpos, de quando costumávamos sentar juntos e passar horas - dias, se deixassem - ali, contemplando aquela luz que nos banhava, me engole todo no momento em que sento. Penso se é realmente a poltrona me cobrindo ou se são os retalhos em que transformaram nossas lembranças.
E estão gastos também os apoios onde minhas mãos e as suas apertavam forte no momento em que éramos um. Como não quisesse machucar e invadir tua carne, castigava a poltrona.
Eu não pedia muito, nêgo. Mesmo.
Bastava ficar te olhando e vendo em você os desenhos que meus dedos faziam ao passar em sua pele. E o cheiro que ficava quando você me abraçava e saía.
Não precisava muito, nêgo.
Mas de repente a poltrona ficou esquecida. Vazia, empoeirada, sem vida.
E agora, nêgo, será que tem volta?

1 Response to É assim, nêgo.

  1. Ian Japinha says:

    Lindo pensamento.. e extremamente tocante, Biel.